sexta-feira, 27 de novembro de 2015


A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NO PROCEDIMENTO DO TRIBUNAL DO JÚRI

CAPÍTULO 1 – DO TRIBUNAL DO JÚRI E SUA HISTÓRIA

1.1  Noções introdutórias

Não há um consenso doutrinário a respeito da origem do Tribunal do Júri. Alguns afirmam que este tribunal surgiu na era mosaica, sob o fundamento de que o conselho de sentença era formado pelos anciãos da época e que a pena não tinha limites. As únicas exigências que se faziam era que se desse ampla publicidade ao fato para que fosse abertamente discutido e que, as penas impostas, fossem de acordo com a vontade de Deus.
Outra corrente de estudiosos, mais céticos, prefere apontar nos áureos tempos de Roma o surgimento doJúri, com os seus judicesjurati. Também na Grécia antiga existia a instituição dos diskatas, isso semmencionar os centenicomitesque eram assim denominados entre os germânicos. Abordemos as maisimportantes. Na Grécia, o sistema de órgãos julgadores era dividido basicamente em dois importantesconselhos: a Helieia (julgava fatos de menor repercussão) e o Areópago(responsável pelos homicídiospremeditados).
Atualmente, pelo que se conclui, o Tribunal do Júri como adotado no Brasil tem sua origem, em verdade, na Inglaterra. Em decorrência da própria aliança que Portugal sempre teve com a Inglaterra, em especial, depois da guerra travada por Napoleão na Europa, quandoa família real veio para o Brasil e com ela todos os costumes e seguimentos europeus que tinham.
Se não há uma certeza absoluta sobre o real nascimento do Tribunal do Júri, muitas vezes por falta de acervo sobre o assunto, ao menos de uma coisa podemos ter plenitude de esclarecimentos a respeito do tema: O Tribunal do Júri é algo, hoje, impossível de ser retirado do sistema jurídico nacional, e não somente por estar previsto como cláusula pétrea, mais que isso, a própria sociedade tem “sede” de fazer “justiça com as próprias mãos” e enxerga no Júri uma possibilidade de realizar os seus anseios.
Segundo Fernando Capez:
O serviço do júri é obrigatório, de modo que a recusa injustificada em servir-lhe constituirá crime de desobediência. A escusa de consciência consiste na recusa do cidadão em submeter-se a obrigação legal a todos imposta, por motivos de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política.[1]

1.2  História do Júri no Mundo e no Brasil
O Júri, como supracitado, não apresentade forma clara a sua origem definida. Sabe-se, porém, que após a Revolução Francesa de 1789, até mesmo pelo momento que a França vivenciava, criou-se emseu ordenamento o Tribunal do Júri. Isto se deu por conta de a França necessitar, naquele momento, de um novo sistema de julgamento que não fosse pelos magistrados comuns, em sua maioria oriundos das castas elevadas e que não gozavam de prestigio junto à massa da plebe.
Diante de tal impasse, a França para amenizar possíveis conflitos adotou esta forma de julgamento, que colocava nas mãos da própria sociedade a decisão sobre determinadas condutas e infrações cometidas. A partir de então, o Tribunal do Júri espalhou-se por quase toda Europa, exceto Dinamarca e Holanda.
No Brasil, o Júri teve sua origem em 18 de junho de 1822, tendo sidoregulado por lei ordinária e era de sua competência o julgamento exclusivo dos crimes de imprensa, sendo formado por vinte e quatro juízes de fato que deveriam ser nomeados pelo Corregedor e Ouvidores do Crime e a requerimento do Procurador da Coroa e Fazenda, que atuava como o Promotor e o Fiscal dos Delitos. Os réus podiam recusar dezesseis dos vinte e quatro nomeados, e só podiam apelar para a clemência real, pois só ao Príncipe cabia a alteração da sentença proferida pelo Júri.
Em pesquisa, foi possível encontrar que, conforme Edneia Bisinotto diz:
Com a Constituição Imperial de 1824, passou a integrar o Poder Judiciário como um de seus órgãos, tendo sua competência ampliada para julgar causas cíveis e criminais. Em 1832 foi disciplinado pelo Código de processo Criminal, o qual conferiu-lhe ampla competência, só restringida em 1842, com a entrada em vigor da lei n. 261.[2]

Em 1981, o Tribunal do Júri foi mantido conforme era na Constituição de 1832. Já na Constituição de 1934 o Júri passou a integrar o Poder Judiciário, dizendo a Carta Magna vigente que Lei determinaria sua competência.
Fato curioso ocorreu em 1937, com a promulgação da nova Constituição, que no tocante ao instituto do Tribunal do Júri se manteve silente. Diante disso houve muita divergência e especulação sobre uma suposta extinção do Júri. Discussão essa que somente foi sanada com o advento da primeira Lei de Processo Penal, o Decreto-lei n 167, em 05 de Janeiro de 1938, instituindo e regulando o Júri.
Já na Constituição de 1946 o Tribunal do Júri retomou sua soberania, sendo incluído como norma entre os direitos e garantias constitucionais. Por sua vez, a Carta Magna de 1967 manteve o Júri e o incluiu no capítulo de direitos e garantias individuais, no Artigo 150, §18, que assim dispunha:
Art 150 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pais a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
...
§ 18 - São mantidas a instituição e a soberania do júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida.[3]

Na atual Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de Outubro de 1988, o Tribunal do Júri está estabelecido no Art. 5º, inciso XXXVIII, e é Cláusula Pétrea por estar dentro do rol de direitos e garantias fundamentais. Além da CRFB/88, o Código de Processo Penal disciplina a matéria referente ao Júri nos seus artigos 406 à 497, ditando o rito a ser seguido perante a instituição do Tribunal especial.

1.3  Princípios norteadores do Júri
Antes de dar definição a qualquer princípio propriamente dito, faz-se necessário explanar o que vem a ser, em síntese, princípio.
Princípio, em verdadeé,como melhor explica Nucci: "a causa primária ou o elemento predominante na constituição de um todo orgânico".[4]

1.3.1     Princípio da Plenitude de Defesa
Este princípio, inerente exclusivamente ao procedimento especial do Júri dá às partes, não somente o que se vê nos procedimentos comuns, o que chamamos de Ampla Defesa. Com este princípio, a CRFB/88 entrega às partes alargadoras formas de convencimento dos jurados ao expressar em seu artigo 5º, XXXVIII, alínea “a” que, verbis;
Artigo 5º ...
...
XXXVIII – é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a)     a plenitude de defesa;[5]
No procedimento comum o réu é amparado pela Ampla Defesa, estando sujeito apenas à defesa técnica[6]. Já no procedimento do júri, por termos como juízes pessoas comuns do povo e, em sua larga maioria, leigas em direito e processo penal, admite-se não somente a defesa chamada técnica, mas também qualquer tipo de tese que sirva para se buscar os interesses do réu, exceto as vedações legais.
Com este princípio elencado como direito e garantia fundamental, é possível valer-se a defesa, além dos argumentos jurídicos, de argumentos emocionais, pessoais, artísticos, religiosos, etc. Ou seja, a defesa se valerá de tudo o que estiver ao seu alcance para buscar o melhor para a situação do réu no caso concreto.
Tendo em vista que o Tribunal do Júri éformado por pessoas comuns do povo, como explanado anteriormente, a defesa do réu deve se aproximar da perfeição, para o convencimento dos jurados. Vale lembrar que no Tribunal Popular a decisão não é fundamentada, vez que os jurados apenas votam, condenando ou absolvendo o acusado. Ademais, como o Tribunal do Júri é soberano, suas decisões não são passíveis de revista, quanto ao mérito, por tribunais togados.
Por tais razões, a necessidade da plena defesa do réu quando se falar em Júri.

1.3.2    Princípio do Sigilo das Votações
O Código de Processo Penal prevê em seu artigo 485 que não havendo dúvida a se esclarecer após a leitura e explicação dos quesitos em plenário, "o juiz presidente, os jurados, o Ministério Público, o assistente, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ão à sala especial a fim de ser procedida a votação".
Por algum tempo, inclusive, discutiu-se a inconstitucionalidade da sala secreta, por entenderem os adeptos de tal corrente que, ao se reunirem ali, feriria o princípio da publicidade dos atos. Ocorre que, por esmagadora maioria na doutrina e jurisprudência consolidada, reconheceu-se a constitucionalidade de tal ato por prever a Carta Magna a possibilidade de se limitar a publicidade de atos processuais quando assim exigirem a defesa da intimidade ou o interesse social ou público.
Ora, há de se justificar também que, embora a sala seja secreta, a publicidade do ato não é tão secreta assim, haja vista acompanharem os jurados tanto a acusação como a defesa, além do juiz presidente e funcionários do Poder Judiciário.
A instalação da sala secreta se faz necessária também para garantir que os jurados não ficarão intimidados com o réu, sua família ou até mesmo a família da vítima, por uma condenação ou absolvição.
Essa segurança em não se ver ameaçado, o jurado teve ainda maior respaldo com o advento da Lei 11.689/2008, que reformou o Código de Processo Penal e introduziu que não poderíamos mais ter votações unânimes pelo Conselho de Sentença, pois com a unanimidade estaria ferido de morte o princípio em comento, trazendo em seu bojo que abertos 04 votos para condenação ou absolvição em qualquer quesito, os demais serão descartados, pois não haveria mais chance de reversão da decisão.
1.3.3     Princípio da Soberania dos Veredictos
Como bem escreve a letra da alínea “c” do inciso XXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal, os veredictos proferidos pelos juízes leigos comuns do povo integrantes do Conselho de Sentença são soberanos, não podendo, portanto serem mudados em seu mérito por Tribunal de segunda instância.
Embora isto seja cediço na doutrina e na letra da lei, muitos Tribunais têm se mantido irresignados com tal princípio de ordem constitucional e, arbitrária e ilegalmente, mudado decisões proferidas pelo Tribunal do Júri.Valem-se os juízes, por vezes, da aplicação de jurisprudência da Corte onde exercem suas funções. No entanto, esquecem eles que os jurados são juízes leigos, que não têm o dever de conhecer as jurisprudências predominantes nos tribunais.
Com tal atitude, os Tribunais de 2ª instância mitigam um princípio constitucional e geram fragilidade à CRFB e ao âmago da sociedade, haja vista se vê a Carta Magna sendo descumprida por quem, em verdade, deveria zelar por sua correta aplicação.
Tourinho Filho argumenta que:
Júri sem um mínimo de soberania é corpo sem alma, instituição inútil. Que
vantagem teria o cidadão de ser julgado pelo tribunal popular se as decisões deste não tivessem um mínimo de soberania? Porque o legislador constituinte esculpiu a instituição do Júri no capítulo pertinente aos direitos e garantias individuais? Qual seria a garantia? A de ser julgado pelos seus pares? Que diferença haveria em ser julgado pelo Juiz togado ou pelo Tribunal leigo? Se o tribunal ad quem, por meio de recurso, examinando as quaestionesfacti e as quaestiones júris, pudesse como juízo rescisório, proferir a decisão adequada, para manter o júri. O legislador constituinte entregou o julgamento ao povo, completamente desligado das filigranas do direito criminal e das súmulas e repositórios jurisprudenciais, para que pudesse decidir com a sua sensibilidade, equilíbrio e independência, longe do princípio segundo o qual o que não está nos autos não existe.[7]

O Código de Processo Penal orienta e faz com que os jurados firmem juramento de decidirem conforme sua consciência, havendo no caso concreto, soluções próprias e adequadas para caso de erro do Júri, onde caberá recurso de apelação e a depender do vício, será remetido o réu a um novo conselho de sentença, sendo inadmissível a reforma da parte de mérito pelo tribunal ad quem.

1.4  Competência do Tribunal do Júri.
O Código Penal elenca quais crimes serão de competência para julgamento do Tribunal do Júri. Com base no que diz a CRFB em seu Art. 5º, XXXVIII, vemos os artigos do CP que se enquadram na norma supra legal, a saber:
Homicídio simples
Art 121. Matar alguem:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
Caso de diminuição de pena
§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
Homicídio qualificado
§ 2° Se o homicídio é cometido:
I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;
II - por motivo futil;
III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;
IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossivel a defesa do ofendido;
V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:
Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
Homicídio culposo
§ 3º Se o homicídio é culposo: (Vide Lei nº 4.611, de 1965)
Pena - detenção, de um a três anos.
Aumento de pena
§ 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)
§ 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. (Incluído pela Lei nº 6.416, de 24.5.1977)
§ 6o A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. (Incluído pela Lei nº 12.720, de 2012)
Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio
Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.
Parágrafo único - A pena é duplicada:
Aumento de pena
I - se o crime é praticado por motivo egoístico;
II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.
Infanticídio
Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após:
Pena - detenção, de dois a seis anos.
Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento
Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque:
Pena - detenção, de um a três anos.
Aborto provocado por terceiro
Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante:
Pena - reclusão, de três a dez anos.
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou debil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.
Forma qualificada
Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.
Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:

Aborto necessário
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da
gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Constata-se então que os crimes que estão a cargo de julgamento pelo Tribunal do Júri são: homicídio, induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio e aborto, todos em sua forma consumada ou tentada.
Além destes, os crimes conexos àqueles também serão avocados pelo Tribunal do Júri, ainda que não sejam, originariamente, de sua competência, conforme nos dispõe o artigo , 78, I, do CPP.

 CAPÍTULO 2 – MÍDIA - PODER DE INFORMAÇÃO CLARA E PUNIÇÃO ANTECIPADA

2.1 Surgimento da mídia e o direito de Informação
Conclui-se que o primeiro vestígio da imprensa no Brasil esteja relacionado com a chegada da Corte Portuguesa em 1808, com a Imprensa Régia. A partir de 10 de setembro de 1808, passa a sair a Gazeta do Rio de Janeiro, na Impressão Régia então recém-instalada no território do Novo Mundo, com a chegada da Corte Portuguesa.
Segundo Tânia de Lucca:
O surgimento propriamente da imprensa no Brasil ocorre em 1808. Já no seu primeiro número, junho desse ano, o Correio Brasiliense, referia-se ao Brasil com Império e tornava-se pioneiro em trazer tal denominação para a imprensa. Mas não
era o criador isolado dessa fórmula, que não tinha caráter premonitório. Hipólito da Costa, redator desse periódico em Londres (onde foram redigidos outros jornais em português), expressava ampla articulação política [...][8]

A Constituição Federal assegura em seu artigo 5º, IX, o direito à livre manifestação de pensamento e de prestação de informação, independente de censura ou licença. Com tal direito incluído entre as garantias e direitos fundamentais, a imprensa ao utilizar-se de tal, origina a hoje bem conhecida liberdade de imprensa, que é baluarte da democracia.

2.2 Liberdade de Imprensa versus Condenação Antecipada
Não são raras as vezes em que nos deparamos com um caso onde o cidadão foi apenas indiciado como suposto agente executor de um crime e, de forma imediata, a mídia em seus diversos meios de propagação, já fazem seu próprio juízo e “condenam” o mero suspeito, levando-o a um patamar onde a reversão deste quadro torna-se absurdamente difícil.
“Crimes dolosos contra a vida, via de regra têm atraído o sensacionalismo da mídia,induzindo muitas vezes o Conselho de Sentença a fazer valer a opinião pública em detrimento de sua livre convicção.” [9]
Por conta de tal exposição midiática a que o procedimento especial do Júri recebe, acabamos tendo um processo onde o que mais vale nem sempre serão as provas trazidas aos autos do processo, mas sim todas as especulações que a mídia, em sua maioria sem fundamento, fez os cidadãos acreditarem como verdade real.
E esta máxima, prejudica o descrito no artigo 472 do CPP, verbis:
Art. 472.  Formado o Conselho de Sentença, o presidente, levantando-se, e, com ele, todos os presentes, fará aos jurados a seguinte exortação:
        Em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidade e a proferir a vossa decisão de acordo com a vossa consciência e os ditames da justiça.
        Os jurados, nominalmente chamados pelo presidente, responderão:
        Assim o prometo. (g.n[10]

Nas palavras de Coelho:

O Tribunal do Júri pretende ser uma forma democrática de cidadania, como se assim fosse uma fórmula de distribuição da justiça feita pelos próprios integrantes do povo, voltada mais à justiça do caso concreto do que à aplicação da mesma justiça a partir de normas jurídicas de grande abstração e generalidade. No entanto, estas características não se verificam de modo pleno neste instituto jurídico, que se torna frágil ao deparar-se com uma significativa e relevante influência dos meios de comunicação nos julgamentos que profere mediante o voto dos jurados. Estes cidadãos comuns são recepcionados por informações construídas com base em juízo de valores que integram a identidade cultural do indivíduo e do contexto social em que vive. O resultado desse processo é o impedimento de um julgamento justo e legal para o réu, pois decorre prévia formação de opinião capaz de influir na atuação da acusação e defesa em plenário.[11]

Diante disto, vemos que há uma evidente colisão entre dois princípios constitucionalmente garantidos; Liberdade de Expressão e Presunção de Inocência. Com tanta informação veiculada, jurados leigos, sentimentos comovidos naturalmente pela compaixão com a vítima e sua família e grandes “atores” em um plenário, fica no ar uma dúvida que dificilmente será sanada com o atual modelo de julgamento dos crimes dolosos contra a vida: Como evitar um julgamento potencialmente injusto sem mitigar a liberdade adquirida ao longo dos anos pela mídia?

 CAPÍTULO 3 – CASOS ATUAIS COM VASTA INFLUÊNCIA
Neste momento, abordaremos aqui casos que ganharam repercussão nacional por envolver brutalidade ou pessoas famosas como parte de uma empreitada criminosa.
Tais réus dos casos descritos abaixo acabaram sendo condenados pelo Tribuinal do Júri mas, antes mesmo da prolação da sentença, todos eles já haviam sido condenados pelos veículos de comunicação pertencentes à mídia.

3.1 Caso Suzana Richthofen e irmãos Cravinhos
O Caso Richthofen é um processo movido pelo MPF (Ministério Público Federal) contra a ré Suzane Louise vonRichthofen e os irmãos Cravinhos: Daniel Cravinhos e Christian Cravinhos.
O caso ocorreu em 2002 e ganhou grande repercussão na mídia nacional por ter sido arquitetado pela própria filha do casal assassinado, visando a obtenção da herança, eis que era uma família de classe alta.
Suzane conheceu Daniel em 1999, através de seu irmão Andreas Richthofen, que se apaixonou pelo aeromodelismo quando viu Daniel praticando o esporte.
Os pais de Suzane, o engenheiro Manfred Albert FreiherrvonRichthofen e a psiquiatra MarísiavonRichthofen, de começo não interferiam no namoro da filha com Daniel, pois achavam que seria algo passageiro.
Com o passar do tempo e com o descobrimento do envolvimento de Daniel com drogas, os pais de Suzane resolveram definitivamente proibir o namoro. Mas nada adiantou pois Suzane e Daniel continuavam namorando, o que por diversas vezes gerou brigas e discussões entre o Manfred e Daniel.
O crime bárbaro em tela foi cometido, segundo narram os autos do processo, em 31/10/2002 e os condenados pelo crime foram exatamente Suzane (filha do casal), Daniel Cravinhos (namorado de Suzane) e Cristian Cravinhos (irmão de Daniel).
Suzane e os Cravinhos, dias antes do crime, fizeram um teste para verificarem o barulho causado pelos disparos de uma arma de fogo e com isso descartaram a ideia de utilizar uma.
No dia do crime, Suzane e Daniel ainda tentavam convencer Cristian à participar do evento criminoso, conforme se vê:
Na tarde de 31 de outubro de 2002, Suzane e Daniel Cravinhos repassaram pela última vez os planos do assassinato dos pais da moça. Conversaram com Cristian, que morava na casa da avó, e Cristian, ainda relutante, não deu a certeza de que participaria nos eventos que se seguiriam à noite. Daniel pediu que o irmão pensasse a respeito e,se resolvesse ajudá-los, que os esperasse em uma dada rua, próxima a um Cyber Café aonde levariam Andreas. Naquela, o irmão de Suzane, Andreas, na ocasião com 15 anos, foi tirado de casa. Foi levado pela garota e pelo namorado dela para um Cyber Café (Lan House), ele foi seduzido pela ideia de que no aniversário de namoro da irmã a comemoração do casal seria em um motel, e a dele seria na LAN House, e que Suzane iria convencer seus pais a deixar o irmão faltar a escola no próximo dia.[12]

Conta ainda o site que:
Por volta da meia-noite, eles estacionaram o carro na garagem. Segundo a polícia, no carro já estavam às barras de ferro, ocas, que foram utilizadas no assassinato. Os rapazes vestiram blusas e meias-calças para evitar que caíssem pêlos pela casa, material que poderia ser usado pela polícia para provar o crime. Suzane subiu as escadas e acendeu a luz do corredor, para que os irmãos tivessem visão do quarto do casal. Marísia e Manfred dormiam. A estudante separou sacos de lixo e luvas cirúrgicas, que eram utilizadas pela mãe, psiquiatra.[13]

Foi divulgado uma parte do depoimento de Suzane logo após ser presa, onde ela diz:
"Chegamos em casa, eu entrei e fui até o quarto dos meus pais. Eles estavam dormindo. Aí, eu desci, acendi a luz efalei que eles podiam ir. Fiquei sentada no sofá, com a mão no ouvido. Eu não queria mais que meus pais morressem.Mas aí eu percebi que não tinha mais o que fazer, que já era muito tarde", confessou Suzane no depoimento após serdetida.[14]

O plano do casal para se livrar dos pais de Suzane, segundo um dos policiais que foi até o local após ligação de Daniel, onde tentavam forjar que houvera um assalto na mansão, foi de amadores, eis que deixaram várias joias e uma arma no local.
A mídia, no caso Richthofen, exerceu grande poderio de convencimento em toda a população nacional e internacional. Por mais brilhante que fosse o advogado de defesa dos agentes do crime, jamais conseguiria uma absolvição para os envolvidos, haja vista ter sido sua presunção de inocência mitigada pelos noticiários de TV, rádio, jornais e revistas, onde desde o início das investigações policiais, já os condenavam.
Como prova do poder da mídia, vemos que até o advogado de defesa tenta se valer desta ferramenta para buscar um jeito de convencer a população da inocência de sua cliente, como vemos o que foi noticiado no site Terra:
De mãos dadas com Barni, Suzane disse que se arrepende muito do seu relacionamento com Daniel Cravinhos, seu namorado na época em que seus pais foram assassinados, e que foi manipulada. "(Ele) sempre me mandava usar muita droga. Me dava cada vez mais droga, isso foi acabando comigo. 'Se você me ama usa. Se me ama faz isso.' E eu ia, ia, ia", relatou a jovem.
A segunda entrevista foi gravada em Itirapina, na casa de amigos. Os jornalistas do programa mantiveram o microfone de Suzane ativado e, por meio dele, puderam ouvir primeiro o advogado DenivaldoBarni Júnior e depois uma voz, que de acordo com a análise de um perito seria de Mário Sérgio de Oliveira, dando orientações para a jovem. Oliveira teria instruído Suzane a chorar e dizer que foi manipulada por Daniel Cravinhos, além de dizer para ela interromper a gravação e afirmar que ela sofria demais com a situação.
"Acabou. Mais nada. Começa a chorar, fala: 'Não quero falar mais. O que ele mandava, sempre dizendo que se o amasse era para fazer. E pelo amor de Deus, nunca mais, que me faz muito mal. E chega.'", disse a voz que seria de Oliveira. Suzane seguiu as orientações e encerrou a reportagem.[15]

O julgamento dos três réus foi marcado para o dia 5 de junho de 2006 no 1º Tribunal do Júri de São Paulo.A imprensa não obteve permissão de filmar, mas cerca de 80 pessoas foram sorteadas (numa lista de 3 mil inscritos)para acompanhar o julgamento. Suzane vonRichthofen chegou ao Fórum por volta das 11:30 horas. Os irmãos Cravinhos chegaram um pouco mais cedo, uma hora antes. O julgamento estava previsto para começar às 13h.
As defesas dos réus usaram de uma estratégia para adiar o Júri:
Os advogados dos irmãos Cravinhos, Geraldo e DivaineJabur — alegando que não conseguiram se encontrar com seus clientes para melhor preparar a defesa — não compareceram ao júri.
Com a ausência dos advogados dos Cravinhos, o julgamento dos irmãos foi cancelado.
Na sequência, após os advogados de Suzane se retirarem do plenário, — depois de uma discussão com o juiz quanto ao fato de uma testemunha imprescindível não ter comparecido; o júri dela também foi adiado.[16]

Com o que feito no primeiro Júri, o juiz da causa preveniu-se para evitar manobras da defesa para tentar adiar novamente o procedimento do Júri.
É como se vê:
Com o intuito de evitar novo adiamento, o juiz do caso tomou algumas precauções, como autorizar encontro entre os irmãos Cravinhos e um de seus advogados no fim de junho de 2006, e nomear um defensor público (e até um substituto para este último) para defender os irmãos, caso seus advogados novamente faltem. Possíveis manobras da defesa de Suzane não eram esperadas, já que ela não tinha mais o benefício de prisão domiciliar. Um novo julgamento foi marcado para segunda-feira, 17 de julho de 2006. A sentença foi proferida na madrugada de sábado, 22 de julho, às 02 a.m.[17]

Após todos os trabalhos onde acusação e defesa sustentaram suas teses, enfim a sentença foi prolatada pelo juiz com base na decisão do conselho de sentença.
Como já era de se esperar, de acordo com a “condenação” midiática realizada, tanto Suzane como os irmãos Cravinhos foram condenados no processo. Não apenas pela mídia, mas também por ela, haja vista haver no processo provasque puderam levar o conselho de sentença a proferir a decisão de condenação, dentre elas a própria confissão de Suzane.
O Tribunal do Júri condenou Suzane vonRichthofen e Daniel Cravinhos a 39 anos de reclusão, mais seis meses de detenção, pelo assassinato do engenheiro Manfred e da psiquiatra Marísia von Richthofen, mortos a pauladas no dia 31 de outubro de 2002, na residência deles, no bairro nobre do Brooklin, em São Paulo. A pena-base foi de 16 anos, mais 04 pelos agravantes, para cada uma das mortes. Ambos tiveram sua pena reduzida em um ano; Suzane por ser à época menor de 21 anos, e Daniel, graças à confissão. Já Christian Cravinhos foi condenado a 38 anos de reclusão, mais seis meses de detenção. Sua pena-base foi de 15 anos, mais 04 pelos agravantes, também para cada uma das mortes. Ele também teve sua pena reduzida em um ano por ter confessado o crime.

3.2 Caso Mércia Nakashima
Mércia Mikie Nakashima era uma advogada brasileira, com ascendência japonesa, filha de Janete Nakashima e Macoto Nakashima.
Ela era ex-namorada e ex-sócia de Mizael Bispo, principal suspeito do crime que foi condenado pelo Tribunal do Júri da Comarca de Guarulhos-SP em 20 anos de reclusão.
Conforme foi publicado no site Globo.com:
Mércia foi vista pela última vez viva em 23 de maio de 2010, após sair da casa dos pais em Guarulhos, na Grande São Paulo. Preocupados por não receberem notícia da advogada, parentes iniciaram as buscas por conta própria. A ausência de resultados fez com que registrassem o desaparecimento na Polícia Civil.
Policiais do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) começaram a investigar e ouviram, entre outros, Mizael. Ele foi até a sede do órgão, no Centro de São Paulo, dias após o sumiço, mas saiu rapidamente sem dar sua versão. Ele chegou a esquecer um documento de identidade no edifício. A pressa chamou a atenção dos investigadores.
Em 31 de maio, o ex-PM foi novamente chamado para depor. Dessa vez preferiu conversar com os policiais civis: contou que não sabia o que havia acontecido com Mércia e que, no dia e na hora em que a ex-namorada desapareceu, estava com uma prostituta em Guarulhos. A garota de programa nunca apareceu.[18]

Mesmo tendo desaparecido dia 23 de maio de 2010, Mércia somente oi encontrada em 11 de junho, ou seja, 19 dias após seu desaparecimento. O que com toda certeza fez com que o corpo da advogada já estivesse bem inchado e deteriorado, tendo sido identificado tão somente pela roupa, sapatos e formato dos dedos. Motivo pelo qual, inclusive, não se pode abrir o caixão em seu velório e sepultamento, que ocorreu no dia seguinte.
O júri do caso Mércia foi totalmente liberado para filmagem e divulgação na íntegra em qualquer meio de comunicação, em decisão inédita do Tribunal de Justiça de São Paulo.
É como se vê abaixo:
Em 15 de março de 2013, após quatro dias de juri, que contou com comunicação audiovisual na íntegra, Mizael Bispo de Souza foi condenado a 20 anos de reclusão pela morte de Mércia Nakashima, em regime inicial fechado. Porém o advogado de acusação Alexandre de Sá, recorrerá, por achar a pena branda, onde desses 20 anos, apenas 7 anos o condenado Mizael Bispo pagará em regime fechado, onde 1 ano ele já pagou, após mediante ao comportamento, poderá pagar em regime semi-aberto, podendo sair de dia e voltar apenas para dormir na cadeia. A família e advogado recorrerão para que suba para no mínimo 25 anos de pena.[19]

O caso gerou grande repercussão nacional, os suspeitos foram seu ex-namorado Mizael Bispo, ex-policial militar e advogado de 40 anos, e o colega dele, o vigilante Evandro Bezerra Silva, de 38 anos, pelo suposto envolvimento no homicídio.Foi um julgamento histórico, pois foi o primeiro julgamento televisionado,transmitido ao vivo, na historia do país.
Como não podia deixar de ser, neste caso de grande repercussão nacional, a mídiaa todo momento afirmava publicamente suas próprias certezas no sentido de que seriam mesmo os acusados responsáveis pelo crime.
Por tal motivo, mais uma vez fica a dúvida a pairar em nossas mentes: “O que é mais importante? O direito de informação da sociedade ou um julgamento justo para não levarmos inocentes ao cárcere nacional?”

3.3 Caso Isabella Nardoni
O caso Isabella Nardoni refere-se à morte da menina brasileira Isabella de Oliveira Nardoni, de cinco anos de idade,arremessada do sexto andar do Edifício London no distrito da Vila Guilherme, em São Paulo, na noite dodia 29 de março de 2008.
O caso gerou grande repercussão no Brasil e Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, respectivamente pai e madrastada criança, foram condenados por homicídio doloso qualificado (art. 121, § 2°, incisos III, IV e V), e vãocumprir pena de 31 anos, 01 mês e 10 dias, no caso dele, com agravantes pelo fato de Isabella ser sua descendente, e 26anos e 08 meses de reclusão no caso de Anna Jatobá, ficando caracterizado como crime hediondo. A decisão foi proferida pelo Juiz Maurício Fossen, no Fórum de Santana em São Paulo.
O caso teve forte repercussão no Brasil, nos dias 30 e 31 de março. Em meio da repercussão, o pai da criança afirmou à polícia no dia 30, que ela havia ficado sozinha no quarto enquanto ele foi buscar os outros filhos. No mesmo dia, a emissora de TV de notícias Globo News revela que a polícia descartou a possibilidade de acidente na morte de Isabella. Segundo um delegado titular da polícia sangue foi encontrado no quarto e um buraco na tela de proteção de uma janela reforçam as suspeitas da polícia de homicídio. A perícia feita pela Polícia Técnico- científica no domingo, diz que a rede de proteção da sacada, foi cortada propositalmente, só que no quarto dos irmãos da Isabella e não no quarto em que ela foi colocada para dormir. No entanto, uma rádio afirmou que o pai disse à polícia que a menina foi jogada por um assaltante.[20]

No dia 1º de abril, o jornal Folha de S. Paulo publicou que os primeiros laudos do Instituto Médico Legal apontavamindícios de asfixia anteriores à queda da menina. Os legistas teriam duvidado até mesmo de que a menina tivesse caído porconta do baixo número de fraturas em seu corpo.
À época dos fatos, os advogados do casal chegaram até a pedir à imprensa que poupassem o casal para evitar sofrimento, visando eles, logicamente, que uma exposição ainda maior na mídia tornaria a defesa muito mais complicada.
É o que vemos nesse trecho retirado do site Terra.com:
"(A perda das chaves) é um fato novo que não vejo problema de tornar público", disse o advogado Rogério Neres de Sousa. Os advogados disseram que cabe à polícia apontar provas que incriminem seus clientes e não a eles.
Os advogados estiveram por cerca de três horas no 9º Distrito Policial. Eles pediram à imprensa para que poupem o pai e a madrasta, pois eles estariam "sofrendo muito e poderiam sofrer ainda mais" com o assédio.[21]

Em entrevista ao programa da Rede Globo Fantástico, a mãe de Isabella deu a seguinte declaração;
Ana Carolina Oliveira disse ao programa Fantástico: "Eu e ele (Alexandre), tínhamos uma relação distante. Mas ela (Isabella) tinha um amor incondicional por esse pai", disse,acrescentando que a menina de cinco anos nunca falou mal do pai. ”Nunca Isabella deu algum sinal, e nunca falou nada sobre o pai. Eu não sei o que aconteceu aquele dia. Fico muito triste em saber que minha filha sofreu, mas o que aconteceu a gente ainda vai descobrir."[22]

Ainda segundo a imprensa on-line:
Provas testemunhais dão conta de que na noite da morte da garota Isabella Nardoni, houve severa discussão entre o casal e que aos gritos, a criança expressou "Pára… pai. Pára.. pai", como se estivesse chamando-o para defendê-la. O caso policial tramitava em segredo de justiça até o dia 7 de abril de 2008, quando o juiz Maurício Fossen, o mesmo que o decretara, revogou-o. De acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo, Fossen tomou a decisão após o promotor Francisco Cembranelli ter revelado alguns detalhes à imprensa na sexta-feira, 4 de abril.[23]

Os advogados do casal Nardoni protocolizaram na tarde do dia 16 de maio um habeas corpus com pedido de liminar. No mesmo dia, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) indeferiu a liminar por entender que a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo estava correta, sendo mantida com isso a prisão preventiva do casal.
O caso da menina Isabella gerou tamanha comoção social que várias foram as manifestações de populares pela condenação do casal. Muito desta comoção se deu pelo fato de ter sido um crime praticado contra criança e, mais ainda, por ter sido um caso que foi amplamente veiculado na mídia. Apesar da brutalidade do crime, e da fragilidade crassa da vítima, cabe analisar a questão se os acontecimentos seriam os mesmos, se a imprensa apenas informasse os fatos, sem apelos emocionais.
Muniz Sodré, salientando a atuação ampla da mídia sobre o julgamento do casoNardoni, ressalta e aponta uma característica particular dessa atuação: a falta de “escuta das vozes favoráveis”, como ele mesmo chama, ao casal suspeito. E acrescenta:
Mídia não é, porém, tribunal do júri. Cabe-lhe expor os fatos e as diligências em curso, mas sem julgar, a despeito do que possa parecer evidente aos olhos de todos. Seria adequadamente jornalístico que se ouvissem as falas de membros das famílias dos acusados, como pai, irmão etc. Daí poderá surgir algo capaz de jogar alguma luz socialmente útil ao conhecimento das distorções perversas da consciência, daquilo que, no português quinhentista, se chamava de maleza.[24]

O caso também teve repercussão no exterior, com alguns artigos. No Reino Unido foram publicadas algumas notícias pela BBC. O periódico francês Le Monde escreveu um artigo intitulado "Sorriso de Isabella assombra o Brasil."
No início de 2009, três desembargadores da 4ª Câmara Criminal do TJ decidiram por unanimidade que o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá seria levado a júri popular. O primeiro dia de julgamento ocorreu em 22 de março de 2010, cerca de dois anos após a morte de Isabella. O júri foi formado por quatro mulheres e três homens. Defesa e acusação contaram com dezesseis testemunhas no total, sendo onze de defesa, duas de acusação e três em comum. Outras sete testemunhas foram dispensadas. Após cinco dias de julgamento, o juiz Maurício Fossen fez o pronunciamento, que foi transmitido por diversas redes de televisão ao vivo, somente através de locução.[25]

Com a vasta influência da mídia e a combinação de provas existentes, ocorreu o que já se esperava, a condenação do casal.
Após cinco dias de julgamento, o juiz fez o pronunciamento, que foi transmitido ao vivo, somente através de locução. O júri considerou o casal culpado por homicídio triplamente qualificado (pela menina ter sido asfixiada, considerado meio cruel, não ter tido chance de defesa, por estar inconsciente ao cair da janela, e por alteração do local do crime ) e fraude processual. Alexandre Nardoni foi condenado a 31 anos, 1 mês e 10 dias - pelo agravante de ser pai de Isabella - e Anna Carolina Jatobá, a 26 anos e 8 meses, emregime fechado. Pela fraude processual, devem cumprir 8 meses e 24 dias, em regime semi-aberto. Por decisão do juiz, eles não poderão recorrer da sentença em liberdade, para garantia da ordem pública.[26]

 CONCLUSÃO
Por todo o exposto, revela-se de grande relevância e atualidade a discussão acerca da influência midiática em procedimentos criminais, com ênfase total no procedimento do Tribunal do Júri, haja vista ser este o procedimento em que se tem pessoas comuns do povo como julgadores, não necessitando tais de conhecimento técnico para sua decisão, bastando seu livre convencimento.
Como bem visto nas páginas deste trabalho, não são poucos os casos em que a mídia, com seu direito de informação, acaba impregnando asociedade com um pré-conceito o que acarreta em uma pré-avaliação do crime supostamente cometido pelos réus denunciados no processo criminal.
Abre-se então a ampla discussão presente em doutrinas, jurisprudência, faculdades, cursos e, inclusive, debates jurídicos a respeito do tema, onde é discutido a questão dos princípios constitucionais do direito a informação e liberdade de expressão frente ao da presunção de inocência, haja vista aquele mitigar a este quando trata-se de crime submetido ao procedimento especial do Júri.
Não podemos abster-nos de dizer que, a influência exercida pela mídia no convencimento dos juízes leigos comuns do povo, em sua maioria, torna-se prejudicial à defesa dos interesses do réu, haja vista buscarem a melhor notícia para estampar a capa do jornal ou a chamada do noticiário, não demonstrando compromisso com a verdade real dos fatos.
A violação de garantias fundamentais dos envolvidos no crime, a manipulação dos fatos e os pré-julgamentos impostos pelos noticiários sensacionalistas demonstra que, ainda que a mídia e o jornalismo cumpram um objetivo essencial em um Estado Democrático de Direito – além do dever de informar inerente à imprensa livre, também contribui ativamente para o ato de pensar e criticar, dando uma perspectiva fundada na razão em busca de necessárias mudanças na sociedade – ela deve, acima de tudo, atuar de forma honesta, séria e responsável, repensando sobre o seu verdadeiro papel, voltando-se para o bem-estar coletivo e não para atender interesses particulares, contribuindo para a construção da verdadeira justiça social.
No mais, certo é que deve o legislador buscar meios de blindar a presunção de inocência do acusado sem mitigar o direito à informação e de livre expressão da mídia, seja ela qual for.

REFERÊNCIAS

[1]CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 671

[2]BISINOTTO. Edneia Freitas Gomes. Origem, história, principiologia e competência do tribunal do júri. Disponível em: < http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3851>. Acesso em 12 fev. 2014.

[3]BRASIL. Constituição Federal de 1967. Disponível em:                                                                                                               <http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10606785/paragrafo-18-artigo-150-da-constituicao-federal-de-1967> Acesso em 12 fev. 2014.
[4]NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.p. 43
[5]BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. 15ª ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: RT, 2013.
[6] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 8ª ed. rev. ampl. e atual. Niterói-RJ: Impetus, 2011. p. 56.
[7] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática de Processo Penal. 24ed. rev. aum. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2002. p.246
[8]MARTINS, A. L; Luca, T. R. História da Imprensa no Brasil. São Paulo, SP: Contexto, 2008. p.30
[9]PRATES, Flávio Cruz; TAVARES, Neusa Felipim dos Anjos. A influência da mídia nas decisões do conselho de sentença. Direito & Justiça, Porto Alegre, Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fadir/article/view/5167> . Acesso em 12 fev. 2014.
[10] BRASIL. Código de Processo Penal Brasileiro: Vigente a partir de 03 de outubro de 1941. Disponível em:                     < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm>. Acesso em: 17 fev. 2014.
[11]COELHO, Carina Ribeiro. Tribunal do Júri e Mídia. Disponível em: <http://www.artigonal.com/direitoartigos/tribunal-do-juri-e-midia-3666329.html.>. Acesso em 17fev.2014.
[12]RICHTHOFEN, Caso. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Richthofen>. Acesso em 18 fev. 2014.
[13]RICHTHOFEN, Caso. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Richthofen>. Acesso em 18 fev. 2014.
[14]RICHTHOFEN, O Caso. Disponível em <http://www.abril.com.br/pagina/storyboard_caso_richthofen.shtml>. Acesso em 18 fev. 2014.
[15]RICHTHOFEN, O Caso. Disponível em: <http://noticias.terra.com.br/brasil/casorichthofen/interna/0OI957594EI6792,00TV+mostra+Suzane+von+Richthofen+armando+entrevista.html>. Acesso em 18 fev. 2014.
[16]RICHTHOFEN, Caso. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Richthofen>. Acesso em 18 fev. 2
014.
[17]RICHTHOFEN, Caso. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Richthofen>. Acesso em 18 fev. 2014.
[18]NAKASHIMA, Entenda o caso Mércia. Disponível em <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/03/entenda-o-caso-mercia-nakashima.html>. Acesso em 27 fev. 2014.
[19]NAKASHIMA, Caso Mércia. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_M%C3%A9rcia_Nakashima>. Acesso em 27 fev. 2014.
[20]NARDONI, Caso Isabela. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Isabella_Nardoni>. Acesso em 11mar. 2014.

[21] ISABELA, Caso: madrasta perdeu chave, diz advogado: Disponível em <http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI2722422-EI5030,00.html>. Acesso em 11 de mar. 2014.
[22] NARDONI, Caso Isabela. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Isabella_Nardoni>. Acesso em 11 mar. 2014.
[23] ISABELA, Juiz revoga sigilo em inquérito sobre morte de. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2008/04/389741-juiz-revoga-sigilo-em-inquerito-sobre-morte-de-isabella.shtml>. Acesso em 11 de mar. 2014
[24]SODRÉ, Muniz. Sobre as vozes do espanto. Observatório da Imprensa, ed. 583, 30 de março de 2010. Disponível em: <http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/sobre_as_vozes_do_espanto>. Acesso em 11 mar. 2014.
[25]NARDONI, Caso Isabela. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Isabella_Nardoni>. Acesso em 11 mar. 2014.
[26] NARDONI. Caso. Disponível em <http://noticias.bol.uol.com.br/brasil/2010/03/27/casal-nardoni-e-condenado.jhtm>. Acesso em 11 mar. 2014.

Por Ligekson Monteiro
Advogado
OAB/RJ 188.091

Um comentário:

  1. Obrigado a todos do GAJ pelo prestígio de sempre. Estamos juntos por um mundo jurídico melhor para todos. #NoAdvogadoEuConfio

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