quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Apadrinhamento Afetivo







Wagner Lyra da Conceição
Advogado, com Pós Graduação em Direito Público
Membro GAJ- Grupo de advogados Jovens, estagiários e bacharéis
Ex – Conselheiro Tutelar no Município de Campos dos Goytacazes/RJ 2009/2012



Recentemente ganhou notoriedade o Programa de Apadrinhamento, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), sagrando-se vencedor do XII Prêmio Innovare, edição 2015.
O projeto, de autoria do Juiz Sergio Luiz Ribeiro de Souza, titular da 4° Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da capital do Rio de Janeiro, permite que crianças e adolescentes que vivam em instituições de acolhimento, construam laços afetivos com famílias pré-selecionadas, dispostas a colaborar na formação educacional desses jovens.
Contudo, antes de adentrarmos ao tema, cabe tecer alguns com comentários acerca da histórica situação de abandono referente às crianças e adolescente no Brasil.
Para melhor análise deste texto, resta destacar que considera-se criança o indivíduo com até doze anos incompletos e adolescente o indivíduo entre doze e dezoito anos.
O abandono envolvendo crianças e adolescentes tem sua origem desde a época do Brasil Colônia de Portugal, todavia, apenas muito tempo após com a criação da “roda” pela Santa casa de Misericórdia, foi possível realizar-se os primeiros registros formais de crianças abandonadas. A “roda” consistia num mecanismo utilizado para abandonar recém-nascidos que ficavam aos cuidados de instituições de caridade. Os mecanismos, em forma de tambor ou portinhola giratória embutido numa parede, eram construídos de tal forma que aquele que expunha a criança não era visto por aquele que a recebia.
Em um salto histórico, chegamos ao tempo em que o Estado/Poder Público, se viu na obrigação de tomar alguma atitude com relação aos infantes abandonados, momento em que fora criada a lei nº. 6.697, de 10 de outubro de 1979, o Código de Menores.
O Código de Menores trazia como princípio balizador, a doutrina da “situação irregular” tipificando varias condutas com conceitos abertos, assim como a situação de abandono, como situação irregular. O código de Menores em suma, buscava resolver todas as questões referentes à situação irregular envolvendo crianças e adolescentes com a colocação em abrigo e não considerava o “menor” um sujeito de direitos, eles eram como “algo que pertencia ao Estado”.
Momentos após foi criada a Lei 8069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente, revogando o Código de Menores e passando a considerar crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, aplicando a estes a Doutrina da proteção Integral, sendo crianças e adolescentes, responsabilidade de todos, família, sociedade e Poder Público.
Às agora crianças e adolescentes, e não mais menores, eram dadas outras oportunidades que não se esgotavam no abrigamento,  agora chamado acolhimento. Neste momento, todas as medidas visam a manutenção dos vínculos familiares e comunitários e o acolhimento, antigo abrigamento, que era regra, agora é medida de caráter excepcional.
Mesmo ante a toda evolução social e legal, ainda há muitas crianças acolhidas em situação de abandono, abandono este que nem sempre se dá de forma física, material, muitas vezes o abandono é intelectual, negligencial, afetivo e etc.
 Sem sombra de dúvidas a evolução das leis e da sociedade, trouxe mais humanização para as crianças e adolescentes em situação de abandono.
 Merece destaque, que as crianças aqui tratadas, estando em instituições de acolhimento, não são jovens em conflito com a lei, não praticaram qualquer crime, que em se tratando de adolescentes se denomina ato infracional, estas crianças estão em situação de vulnerabilidade social.
Em contrapartida, a lei garante a proteção das instituições às crianças e adolescentes até a sua maioridade, e caso a família não tenha condições de recebê-los de volta, ou não consigam ser adotados, seu destino, alcançada a maioridade, é a rua.
Por isso medidas como o apadrinhamento afetivo, são de extrema importância, ainda mais que trata-se da sociedade em que vivemos, de forma que devemos prepará-la da melhor forma possível,  e quanto a isso, nada melhor do que colaborar para o sistema educacional destes infantes e adolescentes.
 O apadrinhamento pode ser dar em três modalidades: afetivo, colaborador ou provedor. Na modalidade afetiva, o padrinho estabelece vínculos com as crianças e adolescentes tanto no ambiente interno quanto no ambiente externo ao do acolhimento, tais como visitas, passeios e comemoração de datas especiais e etc. No apadrinhamento colaborador, a família contribui com a prestação de serviços ao acolhimento e no caso do apadrinhamento provedor, é oferecido suporte material e/ou financeiro a crianças e adolescentes ou às instituições de acolhimento.
Faz-se necessário ressaltar que todo o procedimento passa pela supervisão do Poder Judiciário e equipe técnica do acolhimento, sendo necessário que a família, antes de estabelecer contato com as crianças e adolescentes, ateste ser apta para tal.
O apadrinhamento não é um atalho para a adoção, o projeto propicia às crianças e adolescentes acolhidos e com remotas possibilidades de adoção, a oportunidade de construir laços de afeto com famílias e ter amparo educacional e profissional.
Sabe-se que a sociedade atual tem preferência por certo perfil de crianças para a adoção, de forma que crianças e adolescentes “fora do perfil desejado” encontram mais dificuldades em conseguir a adoção, sejam por serem mais velhas, possuir enfermidades e etc.
Quanto a questão da própria criança e adolescente, merece destacar que as instituições de acolhimento possuem equipe técnica multidisciplinar, de forma que antes de integrar o projeto, são orientados a entender todo o contexto em que estão inseridos, buscando com isso que aproveitem e colham os melhores frutos da experiência.
Por fim, muitas indagações poderão surgir a respeito do projeto, contudo, por mais humanizado que seja o acolhimento, ainda é uma relação institucional, e nada é como ter experiências reais e afetivas.

Wagner Lyra da Conceição OAB/RJ 155754


4 comentários:

  1. Excelente iniciativa do TJ! Porém tal projeto ainda carece de divulgação e incentivo à adesão, tendo em vista que nossa sociedade ainda não se conscientizou que a questão da infância e adolescência do nosso país é de responsabilidade de todos.

    ResponderExcluir
  2. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir

Palavras ofensivas sujeitas a sanções jurídicas.